A relação do futebol com a comunidade LGBTQIA+

Vivência e política contra o preconceito no esporte  

A Copa do Mundo do Catar, que acontecerá entre os dias 20 de novembro até 18 de dezembro, traz, além da animação para o campeonato, discussões sobre violações de direitos humanos. No país árabe, ser homossexual é passível de pena de morte sob a Sharia, sistema jurídico do Islã. Federações de futebol e governantes de países como França e Dinamarca declararam boicote a Copa, alegando falta de clareza sobre as denúncias no país sede.

O primeiro jogador que se assumiu gay na história do futebol foi Justin Fashanu em 1990, inglês que acabou tirando a própria vida em 1998, oito anos depois após sofrer com a descriminação de colegas e também da imprensa da época. No Brasil, apenas três jogadores são abertamente assumidos, como é o caso do ex-jogador Richarlyson, o ex-goleiro Emerson Ferretti e Messi, do Palmeira de Goianinha. 

O futebol masculino ainda é excludente na aceitação de membros da comunidade LGBTQIA+, tendo só um jogador assumido gay atuando nas principais ligas do mundo. Onã Rudá, fundador do Canarinhos LGBT e da LGBTricolor, relaciona essa exclusão à cultura que existe dentro do esporte. Segundo ele, “Existe uma cultura de masculinidade tóxica, que é quase cristalizada no ambiente do futebol. Então ser tóxico no futebol é ser premiado, é algo estimulado”. Onã também associa a falta de representatividade na modalidade devido ao preconceito entre os agentes no esporte e o medo de perder a carreira devido a história de jogadores assumidos.

Para combater o preconceito entre jogadores, foi criado, em 2017, a LiGay Nacional de Futebol Society Brasil, uma associação esportiva que tem como objetivo criar competições para equipes LGBTQIA+. A principal competição é a Champions LiGay, campeonato nacional com atletas cis e trans.

Em outras modalidades, é possível que atletas trans participem do esporte junto com pessoas de seu gênero, como é o caso da ponteira/oposta Tiffany Abreu, atleta trans de vôlei  que atua pelo Osasco Voleibol Clube. No futebol, pela falta de políticas adequadas pela Fifa, não é possível a participação de pessoas transexuais. A LiGay também promove campeonatos exclusivos para atletas trans, como foi o caso da BFEXPO Trans, que ocorreu em Setembro de 2022. 

Douglas de Oliveira é psicólogo e quando criança via o futebol como uma profissão, como uma possibilidade de mudança de vida. Como goleiro, conheceu o Beescats, primeiro time LGBTQIA+ do Rio de Janeiro, dez anos depois de parar de jogar profissionalmente. “Foi quando eu me entendi e assumi a minha sexualidade que eu entendi que não combinava; jogador de futebol e gay eram duas coisas que não cabiam nem na mesma frase, então imagina existir dessa forma”, declara o atleta.

Em um anuário de autoria do Canarinhos LGBT, um coletivo de torcidas LGBTQIA+, foram registrados 42 casos de preconceito apenas em 2021. Com o  alto número de relatos, o Supremo Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) passou a recomendar seus árbitros que relatem quaisquer cânticos homofóbicos nas súmulas dos jogos e também encerrem partidas ao ser percebido qualquer tipo de manifestação preconceituosa. Segundo Onã, a sugestão do STJD é uma tradução das recomendações da FIFA e pode estimular a discussão sobre o assunto.

O Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) prevê no artigo 243-G a punição contra qualquer tipo de discriminação, seja ela racial, de origem étnica, sexo ou cor, com suspensão de atletas e comissão técnica ou multa. Até junho de 2022, oito clubes brasileiros já foram processados pelo STJD por homofobia, superando os processos por injúria racial. 

Douglas fala sobre o desejo de mudanças no futebol. Confira o áudio:

Onã reitera que, para o futebol se tornar um espaço mais inclusivo, é necessário lutar contra a cultura que faz do futebol ser uma modalidade tão exclusivista. “São inúmeros os prejuízos que as ausências de pessoas LGBTQIA+ no esporte traz, não só para o futebol quanto para a sociedade”.

Enquanto a cultura do futebol não abraça a todos, clubes LGBTQIA+ ainda são uma maneira de fazer com que a paixão nacional não acabe para uma parcela da população. No país pentacampeão mundial, onde meninos e meninas sonham em ser jogadores(as) de um esporte que encanta país afora, Douglas se reencontrou na modalidade ao conhecer as ligas voltadas à comunidade gay. “Jogar em campeonatos LGBTQIA+ pra mim é reviver o que eu fiz na minha vida toda, que foi o esporte; só que com uma diferença, dessa vez eu pude ser eu mesmo. Eu era respeitado por ser gay, por ter um namorado e por jogar bem. Jogar esses campeonatos te coloca nesse lugar de existência”, declara. 

Mayara Rocha – 2º período

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