De “casaca” à ex-atleta, os apaixonados contam histórias e origem do amor pelo clube
O dia 28 de outubro é uma data muito especial para os torcedores do Clube de Regatas do Flamengo. Além de comemorar o dia de São Judas Tadeu, padroeiro do clube, é o Dia do Flamenguista, a paixão pelo time trouxe ao adjetivo uma comemoração. O marco faz parte do calendário oficial do Rio de Janeiro desde 2007, quando o então prefeito Cesar Maia aprovou o decreto proposto pelo vereador Jorge Mauro.
A história com o padroeiro começa na década de 1950. O Flamengo vivia um jejum de títulos importantes há quase dez anos – o último troféu levantado tinha sido o de Campeão Carioca de 1944. Reza a lenda que a seca foi interrompida quando o padre Góes, que liderava a igreja de São Judas Tadeu, realizou uma missa na sede do clube, na Gávea.
Na ocasião, se o elenco acendesse uma vela para o santo, conhecido como o santo das causas impossíveis, o clube seria campeão novamente. A “intervenção divina” parece ter funcionado pois o Flamengo conquistou três títulos estaduais consecutivos (1953, 1954 e 1955).
A gratidão é tão grande que todo dia 28 de outubro o flamenguista procura um local para demonstrar sua fé. Seja na igreja de devoção ao santo, localizada no Cosme Velho, ou na sede da Gávea, onde há uma capela. Em 2020, mesmo com todas as dificuldades impostas pelo coronavírus, a assessoria de imprensa do clube informou que celebrará uma missa com funcionários e associados e realizará uma campanha através das redes sociais para os flamenguistas.

Por falar em redes sociais, o fanatismo na internet é uma das marcas do flamenguista. Segundo pesquisa da Ibope Repucom, mais de 35 milhões de pessoas seguem o clube nas redes sociais. No Tik Tok, que passou a ser usado mais recentemente, já ultrapassa a marca de 2 milhões de seguidores. Já a pesquisa da Pluri Consultoria, entidade responsável por diversos estudos no ramo esportivo, aponta que a torcida do Flamengo é a maior do país, deixando para trás Corinthians, São Paulo, Palmeiras e Vasco, respectivamente.
Além disso, o clube divide com o Fluminense o recorde mundial de transmissão esportiva. O feito foi alcançado na final da Taça Rio de 2020, onde os dois clubes se enfrentaram e teve a audiência de 2,8 milhões de pessoas simultaneamente. O recorde anterior também pertencia ao rubro-negro. A paixão pelo clube é motivo de orgulho e os flamenguistas demonstram esse amor de diversas formas.
Uma vez Flamengo, sempre Flamengo
O segurança Wellington Peixoto resolveu marcar na própria pele o fanatismo pelo clube, mas que começou de forma muito curiosa. Botafogo desde criança, sempre brigava com o irmão mais novo quando o clube e o Flamengo se enfrentavam. Aos 17 anos, arrumou o primeiro emprego e, ainda torcedor do Botafogo, convidou o irmão gêmeo para ir ao maracanã assistir Botafogo e Friburguense. Vitória do Friburguense. 1×0.
Para dar o troco, Wallace obrigou Wellington a ir ao Maracanã em 1999. “Ele me levou para assistir Flamengo x Itaperuna. Era a estreia do Romário e ele acabou com o jogo. Flamengo ganhou de três a zero com três gols do baixinho. Eu me apaixonei pela Nação Rubro Negra e pelo Flamengo neste dia. Foi uma loucura!”, diz Wellington.
De lá para cá se passaram pouco mais de 20 anos, e muitas histórias acumuladas. Frequentador da antiga Geral, setor do Maracanã que costumava ter o maior número de torcedores no estádio, ele conta que já fugiu de policiais para conseguir autógrafos, inclusive do ídolo Romário e que chegou atrasado diversas vezes no trabalho por causa do amor ao clube.
“Naquela época tinha que chegar de madrugada na fila para conseguir comprar o ingresso, mas a bilheteria só abria 10h. Era o meu primeiro emprego e eu trabalhava na UERJ, só que o expediente começava às 9h. Eu sempre avisava um dia antes que chegaria atrasado, mas nunca falava que era sobre o Flamengo”, lembra aos risos.
Assista ao vídeo em que Wellington explica as tatuagens em homenagem ao clube
Ao contrário de Wellington que mudou de botafoguense para flamenguista, Marco Antônio se considera rubro-negro de berço. Literalmente. O torcedor de 55 anos nasceu em uma maternidade ao lado da sede do Flamengo, na Gávea. Ele conta que não se lembra ao certo quando ficou apaixonado pelo clube, mas acha que ver alguns craques jogando no time fez com que o amor viesse naturalmente.
Apesar de todas as dificuldades financeiras que vivia na época, ele também já fez muitas loucuras para assistir os ídolos de perto. Na década de 80, viajou de ônibus só com o dinheiro da passagem, também correu da polícia e, como bom geraldino (torcedores que frequentavam o setor Geral do antigo Maracanã) tem muitas histórias para contar. “Já pulei muitas vezes os muros para ficar no setor das cadeiras, e vice-versa. Valia de tudo para ver aquele time de Zico, Adílio, Júnior e cia.”, conta.
Ouça o áudio de Marco em que ele fala sobre o que é “ser Flamengo”
Hoje com condições melhores, Marco Antônio é sócio-proprietário e conselheiro do Flamengo e se considera um homem de muita sorte: é um dos poucos que assistiu in loco todas as conquistas marcantes da história do Flamengo. “Eu estava na final da Libertadores de 1981, no primeiro jogo aqui no Rio. Os sete campeonatos brasileiros e as três copas do Brasil, eu também assisti. E em 2019, estive em Lima para assistir o Flamengo levantar novamente o troféu da Libertadores. Não poderia ser mais realizado que isso.”
A paixão pelo Flamengo, no entanto, não se restringe somente aos homens. A representante comercial Alessandra Oliveira, 45, também é fanática pelo clube rubro negro e herdou a paixão do falecido avô, Rui Gonçalves. “Ele me levava ao Maracanã com seis anos de idade para assistir aos jogos, então a minha referência de clube de futebol sempre foi o Flamengo.”, diz.
Apesar do futebol ainda ser um esporte machista, ela conta que nunca ouviu nenhum tipo de ofensa, mas sabe que a cena é muito comum no estádio.
Ouça o depoimento de Alessandra sobre machismo no futebol
Fascinada pela torcida, ela também acredita que “ser Flamengo” é uma sensação única e somente rubro-negros sabem explicar. No antigo Maracanã, esteve na arquibancada em alguns títulos do clube e jogos com mais de 70 mil pessoas. No novo estádio, foi em todos os jogos da campanha de 2019, onde o Flamengo conquistou 4 dos 6 títulos que disputou.
“Eu estava no jogo contra o Inter. No 5×0 contra o Grêmio. Eu já tinha o ingresso para a final da Libertadores, no Peru, e só não fui porque a hospedagem estava muito cara, mas torci muito em casa. O jogo contra o Grêmio foi mágico. Inexplicável!”

Em uma data tão importante para o clube, o Flamengo dá o primeiro passo para buscar mais um título na temporada. Hoje, às 21h30, o rubro-negro enfrenta o Athletico-PR, fora de casa, no jogo de ida das oitavas de final da Copa do Brasil. Quem sabe não é mais um daqueles jogos para “ficar marcado na história!” e, de quebra, dar um belo presente para o torcedor.
Pedro José Alves – 7º período