
Se fosse possível uma volta no tempo, no mínimo uns 10 anos, teríamos a certeza que “Voando Alto” seria um produto com forte posicionamento social. Em 2019, porém, não é novidade. No quesito contexto e narrativa não traz um frescor significativo, mas isso não diminui, de todo, a proposta de metaforizar os preconceitos enraizados em nosso cotidiano, ainda nos dias de hoje, tendo dois tipos de aves como protagonistas. De um lado da pedra, as gaivotas: conservadoras, tradicionais e com uma linha hierárquica evidente. Do outro, as andorinhas: mais informais, um tanto quanto bagunçadas e com hábitos alimentares mais rudimentares.
“Manou”, uma andorinha órfã adotada por um casal de gaivotas, precisa se provar digno de viver com elas, o que é bem complicado dada a própria diferença anatômica entre as espécies. Os diretores “Andrea Block” e “Christian Haas” são didáticos na representação do aprendizado de uma gaivota filhote. Aulas de vôo, pesca e de navegação com auxílio das estrelas no céu e nosso protagonista precisa se provar capaz de superar todos estes desafios. O didatismo também está presente no roteiro e na elaboração de mensagens de amor ao próximo, questionamentos morais e sociais e entendimento do conceito de família.

A animação usa e abusa da linguagem infantil em todos os aspectos. A narrativa é fácil, direta e bastante previsível e os traços do desenho, mais opacos, remetem a livros infantis de colorir. Se comparada com a dublagem americana, que segue uma tonalidade mais adolescente e malandra, principalmente nas andorinhas, os dubladores brasileiros emprestam suas vozes de modo a infantilizar a grande maioria dos personagens. Um detalhe interessante: é perceptível que há um realce das vozes na mixagem, com efeitos sonoros em segundo plano. É impossível não entender os diálogos entre as aves, desde os mais pausados, até os mais acelerados.
Como todo produto pensado para o público infantil, é necessária a presença da figura de um vilão, daquele que irá atazanar os bonzinhos e que fará com que cada criança grite para tentar ajudar os protagonistas. A vilania, aqui, não é caracterizada num único indivíduo, mas numa outra espécie de animal: os ratos. Desenhados de maneira muito mais assustadora, com olhos arregalados e dentes perfurantes, estes têm apenas uma função e uma necessidade: roubar os ovos dos ninhos, tanto das andorinhas, quanto das gaivotas. A presença dos roedores se faz obrigatória, pois é um dos fatores essenciais para o ponto de virada narrativo onde preconceitos e intolerâncias precisam ser quebrados em prol do bem maior.
“Voando Alto” é o primeiro longa-metragem de animação do estúdio alemão “LUXX STUDIOS”, que tem como portfólio efeitos especiais de filmes e jogos. Fazendo referência às crianças, público-alvo do filme, trata-se de um trabalho para passar de ano com a média do colégio. Embora seja louvável assumir estética e narrativa infantis, é uma aposta arriscada, pois os demais públicos podem ficar impacientes de acompanhar um filme de ritmo mais lento, de diálogos inverossímeis para nossa convivência cotidiana e repleto de clichês.
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Kadu Zargalio – 4º Período | Produção Audiovisual