
“Quem tem medo?”, documentário escrito e dirigido por Dellani Lima, Henrique Zanoni e Ricardo Alves Jr, mostra como diversos artistas e performers vem sendo atacados nos últimos anos no Brasil. A obra conta com depoimentos de profissionais como Wagner Schwartz, Renata Carvalho, Maikon K, José Neto Barbosa entre outros, que foram alvos de repressão e até censura por parte de políticos brasileiros desde 2017. Além disso, também é destacado como a partir da eleição do atual presidente da república, Jair Bolsonaro, a arte passou a ser vista como inimiga. O filme questiona quem tem medo da expressão artística na sociedade atual.
A ideia do longa é bem instigante. Os diretores criam uma dualidade entre os discursos fervorosos e carregados de preconceitos dos políticos, intercalando com a recriação das performances e montagens teatrais dos artistas. Esse contraste revela como é criado um discurso intolerante que nada tem relação real com o trabalho dessas pessoas. Enquanto políticos alinhados a extrema direita atacam dizendo que exposições são apologias a pedofilia, zoofilia ou blasfêmia contra entidades religiosas. O documentário deixa claro que a maldade está muito mais nos olhos de quem acusa, do que no propósito real das apresentações.
Esse aspecto fica ainda mais evidente quando os diretores conseguem captar a emoção dos performers que foram atacados ou censurados de alguma forma. Com ângulos bem fechados nos rostos é possível ver como é doloroso para eles lembrar dos casos e ver como o pensamento artístico deles foi distorcido em prol de bandeiras ideológicas que, muitas vezes, não levam em consideração o olhar do outro.
O roteiro do longa se articula bem fazendo essa mescla entre depoimentos, falas de políticos e performances. Entretanto, mais para o final o filme vai se tornando um pouco maçante, pois abandona essa estrutura para focar mais nas apresentações, mas não é algo que vai fazer o espectador abandonar a exibição.
Durante o filme muitas questões são levantadas e debatidas. Qual o limite entre arte e religião, como a sociedade enxerga a nudez do corpo humano, como a falta de diálogo e a intolerância são prejudiciais. Porém, o principal ponto que os diretores dão destaque é para como a arte representa uma ameaça para certos setores, pois ela dá voz para quem costuma ser esquecido. Prova disso, é que desde 2019, primeiro ano do mandato de Bolsonaro, 130 trabalhos artísticos foram censurados no Brasil, incentivos financeiros foram cortados e o Ministério da Cultura foi extinto.
O documentário, “Quem tem medo?”, ressalta que esse processo de perseguição não começou agora e é provável que não vá se encerrar tão cedo. Enquanto a cultura for vista com desconfiança e como inimiga, ataques como o que ocorreu na sede da produtora “Porta dos Fundos” vão continuar ocorrendo. Para quem estiver disposto a abrir a mente, o filme pode ser uma boa porta de entrada para ter uma outra visão sobre a arte e as diferentes formas como ela se apresenta.
O longa teve sessões presenciais no festival “É tudo verdade” entre os dias 9 e 10 de abril em São Paulo e no Rio de Janeiro. E na plataforma on-line no festival no domingo (10/04), 17 horas.
Assista ao trailer.
Lucas Souza – 6º período