Políticas afirmativas: Uma revolução silenciosa

No Dia Nacional da Consciência Negra e em meio às eleições municipais, discussões a respeito das representações negras na política ganham destaque.

Após 132 anos da abolição da escravatura no Brasil, ainda é possível identificar disparidades nos setores da sociedade em decorrência de séculos de preconceito, racismo e discriminação. Sobretudo, com o avanço das pautas propostas pelo movimento negro na década de 2000, a solução encontrada pelos governantes foi a elaboração de um conjunto de políticas públicas voltadas para os grupos minoritários afim de promover a igualdade.

O conceito de ações afirmativas consiste em reparar e assegurar que todos os cidadãos ocupem espaços no âmbito educacional, político, econômico e profissional. São medidas vigentes na Constituição Federal de 1988 que possuem o objetivo de eliminar desigualdades sociais, raciais, religiosas e de gênero historicamente adquiridas.

A promulgação dessas leis representou a necessidade e a urgência de valorizar a história e a cultura do povo negro. Além disso, foram fundamentais para extinguir o mito da democracia racial que perdurou no Brasil pós-abolição. Dentre elas, pode-se destacar:

  • Estatuto da Igualdade Racial –  Destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos.
  • Lei de Cotas no Ensino Superior – Prevê a reserva de 50% das vagas em cursos de Universidades e Institutos Federais para estudantes de escola pública e estudantes que se autodeclararem pretos, pardos ou indígenas
  • Leis 10.639/03 e 11.645/08 – Obrigatoriedade das temáticas “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena” no Ensino Fundamental e Médio.
  • Lei Caó – Prevê detenção de um a cinco anos para crime de discriminação racial. 

A Lei de Cotas promulgada em 2012 veio para democratizar o acesso das minorias sociais à educação superior, visto que, para muitos a educação é o principal instrumento de mobilidade social. Apesar de não haver um regime de segregação em nosso país, as barreiras que o racismo impõe de modo velado, resultam na exclusão da população negra neste âmbito.

O estudante de Engenharia Mecânica da UERJ, Caio Luis Reis, é fruto da política de cotas da instituição, e conta como foi sua trajetória até a faculdade. “Mesmo estudando em um colégio público de ensino muito precário, tirava boas notas, e por conta disso ganhei uma bolsa de estudos em um dos melhores preparatórios da Zona Norte”. O estudante revelou que se deparou com a diferença entre o que eu tinha como base de ensino em relação aos colegas, o que o impulsionou  positivamente a estudar mais e posteriormente passar para uma Universidade Pública.

A política de inclusão vai além do sistema de cotas. Na UERJ existe uma política de suporte e incentivo ao aluno, como o fornecimento de livros, materiais de apoio e auxílio financeiro em alguns casos. “A universidade cria um ambiente propício para esses bolsistas poderem estudar e desenvolver o seu máximo”. o que confirma a tese de que ações afirmativas são de extrema importância.

“Não reconhecer que a trajetória do ensino começa desigual para nós é não enxergar a realidade. Precisamos de políticas educacionais de longo prazo, mas precisamos também resolver as demandas do agora. Ações afirmativas são essenciais!”

Caio Reis
Segundo o IBGE (2018) a presença de estudantes negros no ensino superior cresceu significativamente, devido às políticas públicas. Fonte: IBGE – PNAD Contínua 2018

A Advogada e Integrante da Década Internacional de Afrodescendentes das Nações Unidas, Lígia Batista, se diz a favor das ações afirmativas e acredita que o Estado deva se responsabilizar pelo o processo de negligência histórica em relação a população negra. E destaca os programas ‘Bolsa Família’ e ‘Minha Casa Minha Vida’ como políticas públicas que deram certo no país. “Essas políticas apesar de não necessariamente estarem direcionadas apenas às pessoas negras, não deixam de ter uma conexão a respeito de quem vive os processos de marginalização econômica” disse.

Políticas afirmativas de fato atingem significativamente uma grande parcela da população. No entanto, muitas vezes são votadas por representantes de uma classe dominante. A ausência de representantes políticos negros é perceptível. De acordo com um estudo de 2018 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os negros e pardos compõe cerca de 25% dos cargos no parlamento, mesmo possuindo um maior número de candidaturas.

“A gente está falando de uma parcela que é expressiva no Brasil. Hoje 56% da população brasileira se autodeclara negra, então existe uma importância muito grande das nossas vozes estarem devidamente representadas nesses espaços, o que não ocorre.”

Lígia Batista
Fonte: IBGE – PNAD Contínua 2018

Lígia afirma que isso se dá por conta da escassez de recursos de campanha e tempo de televisão. Fato que coloca os negros novamente em condições desiguais no embate eleitoral. “O sistema político faz com que pessoas negras não consigam estruturar campanhas”, afirma.

A Socióloga Paula Trubat, reforça a importância dessas candidaturas ao afirmar que do ponto de vista de um recorte de gênero e raça, mulheres e negros são mais numerosos. No entanto, não estão devidamente representados no executivo. Paula destaca a urgência pela presença feminina negra nesses espaços “As mulheres negras são a base pirâmide” conta. 

Marielle Franco, foi uma mulher negra que conquistou grande notoriedade na política. Eleita a vereadora mais votada do Rio de Janeiro em 2016, ficou conhecida por sua atuação em defesa dos direitos humanos, da população negra e das mulheres. Marielle foi assassinada em 14 de março de 2018, sobretudo abrindo portas para que outras mulheres negras ocupassem esse espaço. A Socióloga Paula conta que em reflexo disso, esta foi a primeira eleição regional após a morte da vereadora, com a presença de 2 candidatas negras à prefeitura. “Isso é muito simbólico” relata.

“Quando você deposita seu voto em uma mulher negra, mesmo que ela não seja eleita, você dá a ela um incentivo para que o partido entenda que ela é capaz de ir mais adiante”

Paula Trubat

Desta forma, no dia 20 de Novembro – Dia Nacional da Consciência Negra – celebramos a negritude. A escolha deu-se por ser a data do assassinato de Zumbi dos Palmares, líder do maior quilombo da história brasileira, o Quilombo dos Palmares. Neste dia tão significativo instituições de todo o país promovem diálogos e palestras a respeito das questões raciais com o objetivo de manter viva a memória e a luta do povo negro contra os terríveis anos de escravidão. É válido ressaltar que representatividade negra importa muito.

Gabrielle Lopes – 6º período





Um comentário

  1. Parabéns Gabi, a matéria foi muito bem explorada. Por coincidência, o trabalho se deu no momento que o Brasil está de luto pelo falecimento do negro espancado sté a morte no supermercado em Porto Alegre. Lamentavelmente, o vice presidente do Brasil foi categórico ao afirmar que não existe preconceito no Brasil.

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